17 fevereiro 2007

Os vizinhos

Não era o meio da noite ainda, mas eu já estava dormindo. Havia até sonhado, apesar de adormecido sem tranqüilidade. Pouco depois da 1h, fui acordada por eles.
Eu tinha ido dormir triste, chateada, acho até que fechei os olhos delicadamente, sem apertar as pálpebras. Acho que senti a pocinha de lágrimas ir até a beira, mas segurei, favorecida pela posição – de barriga para cima, nuca presa ao travesseiro, cabeça sem virar para o lado, o que faria esvaziar meus olhos (e permitir que se enchessem de novo).
Então, eles me acordaram. Nesse momento, lembrei de procurar em mim as lágrimas, mas os olhos estavam secos. Elas se foram – sem que eu as visse, ainda bem. No silêncio da rua, da minha casa, o som das vozes deles ganhava uma altura constrangedora. É como se estivessem na sala do meu apartamento. Mais: pareciam estar ali ao lado da minha cama. Fechei os olhos e virei para o lado, como que querendo deixá-los à vontade.
Desisto da discrição e prendo minha atenção no que dizem. Não é possível entender. Afasto a orelha do travesseiro, mas nem com os dois ouvidos a postos consigo entender por que discutem. É um casal, mas agora só ela fala. Há alguns minutos, é só a mulher quem fala. Grita. Chora. Sua voz às vezes vira um rosnar, sai da garganta, o final das palavras fica perdido em algum lugar. Já posso imaginar o rosto inflamado, lavado pelas lágrimas. O homem não falará mais até o final. Eu, pelo menos – talvez a rua inteira, o bairro inteiro –, não o escuto. E ela berra. Recupera o fôlego, segura o choro e, só nessas vezes, posso ouvir que fala em dinheiro, quantias, argumenta com datas.
Dizem que mulher é assim: guarda tudo, lembra de tudo para ser despejado na hora da discussão. Os homens não. Um cara que conheço, é verdade isso, leva na carteira um papelzinho branco, pequeno. Em letra miúda, de um lado ele lista todos os seus 'bens' que estão na casa da namorada; do outro lado, anota palavras-chave de situações que o magoaram e ele relevou ou algo assim; tudo para não correr o risco de esquecer na hora da briga derradeira, a que se desenhar como ponto final da relação.
Na minha cama, fiquei pensando como aquele casal que, de seu quarto (provavelmente), espalhava mágoa janela afora, enchendo a noite da rua e do bairro, se encararia no dia seguinte. Fiquei pensando sobre como um relacionamento se mantém depois de uma briga em que se diz tanto um para o outro. Fiquei pensando em recomeços. E eu acho que fui dormir de novo torcendo por aquele casal quase sem me dar conta. Eu queria acreditar que recomeços são possíveis depois que nos desesperamos. Eu precisava acreditar nisso. O casal vizinho não sabe, mas a desesperada e, de certa forma, corajosa discussão deles me ajudou a entender por que meus olhos se enchiam d'água outra vez.

06 fevereiro 2007

Falta de assunto (no banheiro)


Sabe umas mosquinhas (ou seriam mosquitinhos?) que aparecem no banheiro, de asinhas arredondadas, corpo inteiro praticamente virado em asinhas redondinhas, cinzas? Elas são meio que da cor das letras deste post, sabe? Parecem não ter cabeça, nem patinhas, bem pequenas, sabe? Você está ali no banho, olha pro lado e lá está uma, surgida não sei de onde, não sei a partir de quem, porque como podem se acasalar tão pequenas e frágeis?
Tentei o Google, atrás de alguma imagem, mas não sei o nome delas para fazer a pesquisa - e o google ainda não adivinha pensamentos... (O Fabiano achou !!! Obrigada pela contribuição!!! Olha a mosquinha de banheiro aí do lado.)
Entendeu de quais mosquinhas eu tô falando?
Bem, você já esmagou uma na parede do banheiro ou do box do chuveiro?
Elas são de grafite, não são?


***

Pasta de dente é um troço que não acaba nunca, né? Tem-se sempre a impressão de que em algum canto há mais um naco de pasta para mais uma última escovada. Que coisa. Está ali, toda retorcida, porque foi espremida no dia anterior e também no dia anterior ao do anterior, porque vem sendo espremida há quase uma semana, e tu ainda acha que, no dia seguinte, haverá algo a sair de dentro daquele tubinho já desfigurado.
Fora as técnicas espertas... tem gente que usa o cabinho da escova de dente para alisar o tubo em todo o comprimento. Vem apertando aquilo, desde o fim, certo de que tudo foi empurrado para o bico... tem gente que enrola o tubo também, e vem esmagando com os dedos mesmo.
Mas tem um dia, tem uma manhã daquele dia em que tu tem certeza que vai resolver todas as pendências da tua vida, que simplesmente tu decide que acabou. Chega. E põe a pasta de dente no lixinho ao lado do vaso sanitário. É a primeira decisão de um grande dia, cheio de outras corajosas decisões como essa, tu tem certeza.
Se bem que, se espremesse mais um pouquinho daquele lado ali, talvez saísse um pouco mais de pasta...
Joga isto fora de uma vez, caramba.

Bem juntinhas

Bem juntinhas
eu e a Búio