19 setembro 2008

Sorria, você está sendo filmado

Isso está rolando na Internet: que teremos visita no dia 14 outubro.
Dá pra ver aqui e aqui (este em português).
A Tamara conta tudo lá no Tamis Aí.

A única coisa que eu penso depois de ler e ver isso é:

Por que não?

Na dúvida, vou dar uma olhadinha pro céu no dia 14 de outubro.
E sorrir.
Ao imaginar esse momento, penso o seguinte: se nada eu enxergar, acho que vou sentir "que pena, ainda não foi dessa vez".
Tô falando sério.
É que tb não sei se todos têm o direito de ver. Se todos, sem distinção, têm a capacidade de ver.
Qual o tamanho de percepção do seu espírito?
Uma das sacadas mais intrigantes do filme Quem Somos Nós, eu acho, é aquela em que eles falam sobre a chegada das caravelas portuguesas (ou espanholas, sei lá). Os índios não as viram. Não viram mesmo estando próximas, apenas notaram que o mar estava diferente. Eles não teriam visto as embarcações porque não as conheciam.
Bom, né? Intrigante, ao menos. Afinal, como (re)conhecer o que não se conhece? O que não pertence ao nosso imaginário, ao nosso mundo?

16 setembro 2008

Alt Tab

A coisa tá feia por .
(Pra completar ainda tem furacão.) Será que vamos assistir à queda do império americano? Achei que isso fosse uma invenção dos livros de história do colegial. Tipo queda do império romano. Tipo queda de Constantinopla pelos turcos otomanos.
Turcos otomanos.
Otomanos é tri, né? Essa palavra. Como será que eles eram? Acho que eram morenos jambo, fortes, nada de traços finos ou corpos longilíneos.
Os americanos são gordinhos. E meio vermelhos.

***

Eu acho que massagem devia figurar na Declaração Universal dos Direitos do Homem.
"Todo homem tem direito a ser massageado por uma hora (ou mais) uma vez (ou mais) por semana."
Porque massagem é muito bom.
Mas por que a gente sai da massagem com cara amassada de quem acabou de acordar? Nem se massageia a cara...
Será que enquanto recebe a massagem o corpo dorme à revelia de nossa consciência? Ou será que enquanto dormimos alguém vem e nos massageia?

***

Massageado por um turco otomano. Ih, continuo misturando assuntos nada a ver. Abrindo arquivos e mantendo-os assim, soltos e à disposição. Folheando-os. Tipo ALT TAB na tela.

12 setembro 2008

Pelo fim dos coletes

Tô fazendo um trabalho que me leva a entrevistar produtores de fumo. É pra Souza Cruz. Já fui a Rio Negro (PR) e a Paraíso do Sul, aqui, perto de Santa Maria. São pessoas simples, muito simples. É comovente. O mínimo conforto que hoje têm é fruto de anos de lida na lavoura, na lavoura de fumo.
Não gosto de cigarro. Acho burro fumar. Acho burro tanta grana girar em torno de algo que faz mal. Tudo bem que isso teve lá seu charme. Mas em pleno século 21? Não entendo um adolescente escolher o cigarro, por exemplo.
Mas quando encontrei essas famílias de produtores, não pude pensar só assim. Eles devem tudo a Souza Cruz. Tive vontade de dizer "sabia que o que vcs plantam matou meu pai?". Mas sei que não foi só isso que matou meu pai (quem ainda acha que doenças são meramente físicas?). E mais do que isso sei que não tinha o direito de questionar a oportunidade (talvez a única) de trabalho e sustento que tiveram. A vida não é lógica, Loraine.
Mas me incomoda muito a certeza de que, embora salve famílias, o dinheiro da Souza Cruz é para vender cigarro. Hoje, por exemplo, fiquei sabendo que um amigo talvez não viaje pra representar o RS e o BR no mundial de duathlon porque não há dinheiro. O Estado não tem pra dar, e nunca nenhum empresário se mexeu.
Entre ver alguém fumando e ver alguém correndo, se exercitando, naquelas roupas bacanas, óculos de sol colorido... qual das cenas é mais estimulante, inspiradora, admirável? Qual?

Dizem que não falo. É verdade. Mas falar o quê? Olha em volta, ouve. Sobre o que as pessoas falam? Rigorosamente, sobre o quê?

Dizem que sou calma. Não é verdade. Sou controlada. É diferente. E cansa pra caramba.
O que fazer quando a pessoa se aproxima e pede licença para sentar ao teu lado no banco do ônibus?
alternativa A: pergunta por que? (rsrsrs)
alternativa B: diz sim? (q meigo...)
alternativa C: diz não????!?!?! (hahaha)
alternativa D: bate? (ok, ok, ok menos, Loraine; mas as convenções vazias me irritam)
Tenho vontade de bater em guri que usa colete. Aqueles de lãzinha, sabe? Bater. Pelamordedeus.

É fácil ser honesto, responsável, sensato, ajuizado mantendo-se longe das situações que provocam o oposto disso tudo. Nunca provei drogas, por exemplo. Isso hoje pode ser uma convicção do tipo "tenho mais o que fazer". Mas e antes? Antes nunca encarei a oferta, nunca cheguei perto para realmente testar minhas convicções. Então, não vale dizer que fui uma adolescente responsável. Não vale.
Temos uma idéia das coisas. Quando distantes. E essa idéia tem muita chance de mudar quando nos aproximamos e vivemos essas coisas. Lição que aprendi duramente: não julgue. Não fale sobre o que só conhece de ouvir falar.

Criança ainda, incentivada por minha mãe que se sentava meia-bunda na beirada da minha cama, eu rezava. O credo, o pai-nosso, a ave-maria. A mais remota lembrança disso é minha mãe juntando com as suas as minhas palmas, me ensinando o gesto de prece. Ela falava uma frase, eu repetia. Que pena, na época não saquei a beleza de tudo isso. Nunca entendi uma só palavra do que era dito.
Faz tempo que desisti dos textos prontos. Eu rezo sim, mas é uma conversa. Um bate-papo íntimo. Sem emitir palavras, muitas vezes. O silêncio é uma prece. (Tem gente que vai achar que eu tô sempre em prece rsrsrsrs.)
Não tenho nada contra o texto das rezas. Sempre que os ouço na igreja ou numa palestra espírita, brinco mentalmente: as palavras vão sendo formadas na minha mente letra a letra, como que sendo datilografadas numa superfície. Só para passar o tempo.
Mas o que eu gosto mesmo é de não ouvir palavra alguma, me desatentar delas. E ficar só com o murmúrio. É isso. Muita gente rezando junto faz um murmúrio indecifrável no ambiente. Uma coisa assim:
mmmmmsrsrsszzzzcchhhhhhzzzzzzmmmmmmsssssschxxxxxcxhmmm
Esse som eu gosto. Ele quase se separa das palavras e vira a melodia delas. Se concentrar bem nele, é como o efeito dos mantras, será que não?
Mas o que eu ia dizer é que, depois de rezar, criança ainda, eu me sentia liberada para os pedidos, claro. Eu lembro de pedir muitas coisas. Não lembro de pedir "quero ser feliz". Depois, crescidinha, de novo desviei do "quero ser feliz" e, mais do que rezar e pedir, eu botei na cabeça o seguinte: quero ser uma velhinha com histórias para contar. Não posso, não quero, morro de pavor de chegar lá no fim, olhar pra trás e não ver nada.
Bom, eu já tenho histórias para contar, acho que vai dar certo.

Roubei do Carpinejar. O Fabrício. Isso: "O que adianta uma pele sem cicatrizes numa alma apavorada?"

Leram isso, meninos-de-colete?

03 setembro 2008

Zanzando

Não sei se ficam somente na Protásio Alves, de lá pra cá, de cá pra lá. Mas é sempre ali que os encontro, espalhados pelas paradas de ônibus. São crianças na beirada da adolescência, outros são grandinhos até. Há meninas e meninos. É a turma da bala de goma.
Pedem uma força pro motorista e entram. Ou largam a caixa de bala na mesinha do cobrador e a pegam de volta depois de passar por baixo da roleta ou esmagam as gomas no peito, esgueirando-se, limpando com as costas o chão do corredor. E aí começam a ladainha. O mesmo discurso, as mesmas balas. Todos eles. E todos eles dão uma entonação de rap pro anúncio. Tenta imaginar o som de rap no seguinte texto:
/boa noite/desculpa incomodar sua viagem/mas estou aqui/trabalhando/eu podia estar roubando/e não estou/podia estar pedindo/e não estou/então eu peço um minuto de sua atenção/
(aí, eles já vão pegando as balas de dentro da caixa pra mostrar, combinando texto e ação, como se fosse comissária de bordo dando aquelas informações de emergência em vôo)
/uma é cinquenta centavos/ três é um real
(aí eles vão de fileira em fileira: aceita? aceita? aceita? aceita? ou ... bala de goma? bala de goma? bala de goma?)
Se despedem com um discurso treinado também.
Perguntei pra um deles se havia alguém por trás dessa venda. O guri, um adolescente de boné, moletom surrado e bermuda, com correntes grossas de prata no pescoço, disse que não. Que eles compravam no atacado e vendiam. Quanto por dia, eu perguntei. Sete, oito caixas, ele disse. Quanto dá isso, devolvi. Ele: uns 70, 80 por dia (reais).
Mas é estranho... é sempre a mesma marca de bala, eles falam todos a mesma coisa, como que treinados, e parecem se conhecer. Não me convenci, mas o guri desceu em seguida, e minha entrevista acabou.
70 por dia x 5 dias são 350 por semana x 4 semanas = 1,4 mil por mês. Quanto é o salário mínimo? Será que o guri falou sério?



Não tem restaurante aberto às 17h para almoçar. Entro no supermercado, compro um pote de risoto e outro de brócolis cozido. Não dá tempo de ir pra casa. Tenho mais rua pela frente ainda. Sento no banco interno do súper e começo minha refeição. Comprei um pacote de colher de plástico pra ajudar. Uma só já bastava. As pessoas passam e me olham. Tá, é esquisito. Mas é esquisito o quê? Eu almoçar às 17h? Eu fazer isso no banco? Eu comer de colher? Ou eu estar com comida e não com um pacote de ruffles ou de bolachinha recheada?
Oi. Meus olhos diziam pra os que me miravam.


Os moradores de rua comem na rua, claro. Eles fazem tudo na rua. Morador de rua, eu acho, se apropria mais de sua cidade do que nós, moradores de casa. Eles deitam no gramado do parque, dormem no banco da praça, sacodem as pernas sentados no parapeito do viaduto da Ipiranga. Se apropriam. A cidade é deles, ainda que selvagemente. Não sei, mas os invejo. Tu consegue simplesmente sentar no cordão da calçada enquanto espera o ônibus? Por que q não? Bom, tem gente que não senta nem no chão de sua própria casa. Eu adoro o meu chão.


Os hidrantes deixam as calçadas charmosas. Vermelhos ou roseados. Algumas coisas são padrões curiosos. Que nem casinhas de fazer chave. Por que todas, eu disse TODAS, são azul e amarelo?


Trabalho, trabalho, trabalho na frente desse computador e de tempos em tempos dou um pulo ali no mundo - ou em uma das realidades dele. Acesso os portais de notícia e fico sabendo mais do mesmo de sempre. Grampos é o mais-do-mesmo da vez.
Será que a grampolândia chegou ao msn? Olha, deve ser questão de tempo.


Setembro não termina nunca e acabou de começar de novo. Venta ventania. Depois, em outubro, o roxo dos jacarandás da praça da alfândega pinta as calçadas de toda a cidade. Voa de lá, do Centro. Claro. Se anelassem o cabinho das flores como fazem com as patinhas de aves em extinção q estão sendo estudadas, você comprovaria.


Já escrevi sobre o roxo das calçadas em outubro láááá atrás neste bLOg. Também já escrevi um post chamado "Zanzando". Ando me repetindo. Chato. Dizem que, depois de um tempo, não aprendemos mais nada, nem fazemos novos amigos. Nos repetimos nisso também. Será? Ai, tomara que não. Aprender e pertencer me são os verbos/ações/condições mais valorosas (também já escrevi isso nesse blog). Aprendemos com amigos e pertencemos a eles. Ensinamos e somos pertences deles. Deusolivre a fonte secar.
Li esses dias a expressão 'alma coletiva de um povo', que seria formada pela mistura de raças - no caso, a brasileira é muito rica. Aí, pensei que nós, do ponto de vista solitário, uno, também podemos ter uma alma coletiva, formada pela influência de amigos, das pessoas que nos cercam continuamente. E, vice-versa, fazemos parte da alma dessas pessoas. Deve ser daí que tiraram aquela "Digas com quem andas que te direis..."


Minha bala de goma preferida é a roxa. Roxa como as florzinhas dos jacarandás.

Zanzei, zanzei, zanzei pela cidade.
Zanzei, zanzei, zanzei o pensamento.
Voando o pensamento. Deve ser o vento de setembro.

Bem juntinhas

Bem juntinhas
eu e a Búio