17 setembro 2010

Portinha da boa vontade

E vem aí mais uma Grafia, e o tema desta edição é terror. Daí que me dei conta de que nunca escrevi aqui no bLOg sobre terror.
Porque tem texto daqui que vai pra Grafia, e dessa vez tem de ir mais um. Gostaria que sim. Só que... acabei de dizer... nunca escrevi sobre terror. Não gosto de filme de terror, tenho medo. A coisa toda me lembrou uma amiga que não vejo há muito tempo: ela ri de gargalhar quando assiste a filmes de terror. A invejo terrivelmente. Mas não... o comportamento de minha amiga não me rendeu um texto...
Aí o meu amigo que faz a Grafia disse que medo faz parte, a questão é sentir prazer no medo. Bom, então não sinto prazer no medo. Vai um abraço pra quem sente.
Mas sinto prazer em ver texto meu na Grafia, porque a Grafia é bonitona. Então... vamos tentar, eu disse. Ou seja, abri a portinha da boa vontade.

(conhece a portinha da boa vontade? ela fica na cabeça, mas seu efeito se espalha pelo corpo, deixa tudo mais alerta, no sentido de sensível a. Abre a porta lá e escancara as basculantes da percepção aqui e acolá, como se deixasse entrar luz, aquecendo nosso motorzinho íntimo que põe a funcionar a engrenagem da criatividade, aquela que soluciona as coisas.)

Deixei a portinha aberta e saí por aí. Pendurei a pendência no meu varal mental e deixei o vento sacudir, tipo aquelas bandeirinhas de templo budista, sabe? Daí que no mesmo dia em que deixei a portinha aberta, logo mais à noite, testemunhei as duas primeiras situações descritas abaixo, e entendi que tinha uma ideia de texto: listar horrores cotidianos... A lista não tem nenhum critério, alguns itens são bem questionáveis, outros oscilam numa, digamos, escala de horror.
Mas terror é o mesmo que horror? Terror é a coisa, horror é a sensação fruto da coisa. Não? Ah, sei lá... não complica aí, srGrafia. Ou vai ficar sem texto. E eu sem prazer.

TEXTO

Show de horror

> Tentar atravessar de carro alguma das vias centrais da cidade, em dia de jogo do Grêmio ou do Inter, às sete da noite - no rádio, não tem nem música, porque é hora da Voz do Brasil.

> Assistir a uma briga de trânsito bem de perto.

> Pisar no coco.

> Ver quem vc queria pra junto de si escolher outra pessoa.

> Programa eleitoral gratuito.

> Tentar fazer qualquer coisa com os olhos estando com dor de cabeça.

> O BIG ou o Carrefour no sábado à tarde, na véspera de Natal.

> Geladeira vazia.

> Fossa de amigo.

> A tua fossa.

> Ressaca etílica com efeitos gastrointestinais.

> Cofrinhos de fora.

> Retorno da praia, estrada engarrafada, sol na cara, carro sem ar, 40 graus.

> Pedalar contra o vento.

> série A4 de natação.

> Homens/mulheres que dizem "sabe quem eu tô pegando?"

> Acampamento farroupilha com chuvarada.

> Ligação de telemarketing.

> Tentar resolver algum problema com a Net.

> Pelego (a coisa e a pessoa).

> editorial de jornal de esquerda.

> editorial de jornal de direita.

> gente que ainda vê o mundo dividido.

> Carnaval de clube. No litoral. Gaúcho.

> Programação de TV aberta no domingo à tarde.

> Sotaques em novelas.

> RT de elogio, no twitter.

> Vídeo que não carrega.

> Conexão lenta.

> Mau hálito.

> Limpador de para-brisa que não dá vencimento.

> Separar sujeito e verbo com vírgula.

> gente que não contente em usar um ! usa 3, 4... !!!!!

> Correr de bermudão.

> Sanitário ecológico em fim de show.

> Derramamento de óleo no mar.

> Baleias encalhadas morrendo.

> Listas em geral.


***

Voltando à portinha da boa vontade.
Se ela estiver aberta, dificilmente as coisas descritas aqui (ou tantas outras, vc não pensou em algumas?), embora terríveis, nos causam tanto horror assim... Dá até pra gargalhar, como faz minha amiga. Mas em alguns casos, tem de escancarar bem essa porta da boa vontade, tah? Esgamela o negócio aeeeee.

14 setembro 2010

Salário máximo

Trechos da entrevista com Carlos Ribeiro, ex-presidente da HP Brasil, na TRIP 192.

"Já estava há oito anos na presidência e percebia que não estava mais no máximo do meu pique de criatividade."

" Minha ideia inicial era me aposentar em 2009, 2010. Mas a morte do meu pai, em agosto de 2005, fez com que eu antecipasse isso. Eu estava no velório dele e me deu um estalo. Pensei: “O que eu estou esperando?"

"É claro que abri mão de muitas coisas, né? Mas também me livrei de um monte de coisas chatas. Claro que eu poderia estar ganhando muito mais do que agora, com a aposentadoria e o fundo de pensão. A gente tem que viver de reservas. Mas felizmente conseguimos poupar o suficiente para montar essa estrutura e levar a vida que a gente quer."

"A gente sempre procurou separar bem isso: o que eu era de verdade e o papel que eu tinha de interpretar, ou seja, o de um presidente de uma grande empresa pelo qual eu era remunerado. Eu participava desses eventos com empresários. Mas aquilo não era o meu natural. Até porque sou mais introvertido. Nesses eventos há um certo artificialismo. Sempre soube que aquilo um dia ia acabar."


Deu para entender mais ou menos, neh? Ele largou um supercargo para viver de forma mais simples no campo e tal.
É claro que tomar essa decisão parece mais fácil quando temos uma grana considerável de reserva/economia. Caso dele. Mas quem ler a entrevista na íntegra vai ver que ele só tomou essa decisão efetivamente depois de levar umas porradas emocionais.
Pensei duas coisas ao ler essa entrevista:
1) É muito difícil saber a hora de mudar, de parar, de baixar a rotação sem essas porradas. Precisamos de um nível tal de sintonia com a vida que... nossa. Coisa de monge.
2) Lembrei também que devíamos todos saber a hora de parar de ganhar dinheiro. Não vejo as pessoas refletirem sobre isso. Seu teto, sabe? Uma vez conversava com um amigo sobre isso, na volta da praia, pela freeway (ele costumava me ler aqui, será que continua? tu taí? lembra disso?). Falávamos sobre isso: qual teu teto salarial? Eu falava, na verdade. Com quanto tu acha que poderia viver tranquilamente?
Não vejo as pessoas pensarem nesse valor. Vejo pessoas querendo ganhar mais e criando novas necessidades para justificar esses mais.
Sei que as coisas são relativas, e que o que importa mesmo é a intenção das coisas; então uma mesma coisa pode ser prejudicial ou saudável dependendo da intenção da pessoa, mas eu realmente acho que conhecer nosso salário máximo é tão importante quanto garantir um salário mínimo decente pra todos.

Bem juntinhas

Bem juntinhas
eu e a Búio