28 dezembro 2011

Roubos (13)

Aí vai um graaaaande (em todos os sentidos) roubo para encerrar 2011 (e, quem sabe, servir de inspiração para 2012, como sugeriu a autora da entrevista).
As frases abaixo são da gaúcha Debora Noal, que é psicóloga na organização Médicos sem Fronteiras.


"Um dia um amigo me disse: “Ó, Débora, acho que você tem todo o perfil para trabalhar nos Médicos Sem Fronteiras. Você nunca pensou nisso?” Eu nunca tinha escutado sobre os Médicos Sem Fronteiras na minha vida. (...) ele disse: “Sabe, Debora, eu acho que há coisas que a gente precisa pensar... porque provavelmente alguém, em algum lugar do mundo, está esperando por você”. Eu fiquei pensando... É, teoricamente isso não faz nenhum sentido. Alguém, em algum lugar do mundo, está esperando por mim? Ok, né? Mas essa frase ficou, ficou bem forte."

"O que não é possível carregar comigo é porque não é meu. As pessoas diziam... “Mas você vai deixar tudo? Máquina de lavar no meio do corredor, televisão... e se roubarem?” Se roubarem, roubaram... O que eu vou fazer? Não posso passar minha vida inteira segurando uma televisão na mão... Lembro que eu ia recebendo emails dos vizinhos ao longo dos meses. “Posso ficar com a sua máquina de lavar roupa?” Pode. “O seu quadro está no meio do corredor... posso botar na minha casa?” Pode."

"Em missão todo dia é segunda-feira de manhã. Não existe sábado, não existe domingo. Você acorda e é segunda-feira, no outro dia é segunda-feira de novo, e no outro ainda é segunda-feira, e todo mundo tem muito... muito brilho no olho. Sabe? (...) É assim.. você está cansada, você está aniquilada, mas a alma está salva, você está se sentindo bem com o que está fazendo. Não tem nenhuma conotação religiosa, a gente até brinca que somos os “ateus sem fronteiras”. A gente acredita no cuidado com o ser humano. Não dá para esperar uma entidade – tomara que ela exista, e tomara que ela um dia comece a se organizar de uma outra forma, porque o mundo é bem cruel. Mas a gente precisa cuidar agora."

"Num trabalho de urgência aqui no Brasil, por exemplo, a urgência é do outro, não é a sua urgência. Mas, quando você está numa catástrofe, a urgência também é sua, porque você também está sob o efeito da catástrofe natural. Por exemplo, no terremoto eu estava atendendo as pessoas e o chão estava tremendo. Então eu também estava dentro de uma estrutura de perigo, que é a grande diferença da urgência que a gente vive aqui. (...) Lá, numa catástrofe, não. Você está junto, você vivencia a catástrofe junto com o outro. É uma forma de dizer para o outro: ok, você não está sozinho, estamos juntos nessa. Isso é bem maluco."

"e eu lembro que cada vez que começava um novo tremor de terra as pessoas tinham o ímpeto de sair correndo. Só o fato de você estar ainda dentro da estrutura e de dizer para a pessoa – “Olha, o engenheiro já disse que essa unidade não vai cair se tiver um outro terremoto até 7.0, então a gente pode ficar, e vamos ficar juntos” – já muda. E a outra maneira é investigar coisas bem práticas: que tipo de coisa você pode ir fazendo para se estabilizar. Quase sempre o pedido é o mesmo: “Me ajuda a esquecer”. "

"E às vezes você faz um atendimento e fica guardado na cabeça das pessoas para o resto da vida. Você pode mudar completamente o destino de uma pessoa com um simples atendimento. "

"Cheiro é uma coisa difícil de contar para as pessoas. O cheiro da morte é um negócio difícil de descrever. Como você descreve o cheiro da morte? Cheiro de ser humano. No Brasil, a gente tem muito pouco cheiro de ser humano. Porque ser humano não cheira bem, o ser humano cheira mal. Tipo: fique sem colocar seu desodorante, sem passar xampu no cabelo, sem passar um bom sabonete no corpo, sem passar um creme, um protetor solar. E sinta seu cheiro daqui a uma semana. É um cheiro forte de gente. E eu vivo sentindo cheiro de gente, em todos os lugares. Normalmente, nos lugares aonde eu vou não existe xampu, não existe sabonete, não existe desodorante. Cheiro de ser humano é um negócio impressionante. E o cheiro do medo do ser humano é uma coisa forte, também. "

"Posso descrever para as pessoas o rosto, a postura de dor, de sofrimento, mas o cheiro eu não consigo descrever. É uma das coisas mais fortes que eu senti naquela missão. O cheiro da morte. Primeiro, você começa a perder a capacidade de sentir seu próprio cheiro, imagina o cheiro dos outros. E, depois de um tempo, você começa a perceber que tudo cheira, inclusive o medo, a morte, a dor, a felicidade – tudo tem seu próprio cheiro. E às vezes é bem doído. "

"É a minha décima missão, mas cada vez que ele me liga é uma felicidade, uma sensação bem maluca. Ele está me dizendo que aconteceu um furacão, um terremoto, e eu estou muito feliz porque sou eu que fui chamada para ir nessa missão. Podia ser qualquer outra pessoa, mas escolheram a mim. E me dá uma sensação boa, sabe? Sou eu que estou indo vivenciar isso, dividir isso com aquelas pessoas, naquele momento, naquele lugar. É uma sensação maluca, tipo: o salário não é bom, as condições de vida não são boas, a segurança e a estabilidade são zero, e ainda assim eu sou a pessoa mais feliz do mundo cada vez que ele me liga dizendo que estou indo."

"Desde pequena eu escuto: “Na tua cabeça tem um guia. Se você acredita que dá para fazer, vai e faz”. Minha mãe sempre dizia e diz até hoje. “Mas o que você acha, minha filha, você acha que isso vai dar certo?”. E eu sempre acho que vai dar certo. “Então faz”, ela diz. “Você tem mais coisas dentro de você do que consegue me dizer. Então, se acha que dá para fazer, faz”"

"Até porque eu me levo para todo lugar, né? Eu não tenho como fugir. Eu estou junto comigo o tempo todo."

"Faço coisas que me dão a sensação de que ainda brilha o meu olho. Acho que quando eu olho para alguma coisa que eu sinto... hum, isso não faz meu olho brilhar... eu não fico. Posso estar ganhando o melhor salário do mundo, posso estar num lugar extremamente estável e confortável. Não é isso que me dá o grande prazer. É a sensação de estar viva. Acho que tem muita gente no mundo que não está viva. Está andando por aí, mas viva não está."


*
Entrevista completa aqui.
Eu roubo por este motivo ----> Roubos (1)

13 novembro 2011

Caldo

Acho que juntar este texto com este outro texto pode dar um bom caldo.
Juntaí. (os textos seguem aqui também, caso os links originais não funcionem)

O primeiro é do Fred Mattos, que me impressiona quase sempre. Sua capacidade de explicar coisas é incrível.
O segundo é do portal PdH, cujo conteúdo também me impressiona quase sempre. Aliás, esse movimento pró-homem (portais, revistas... ) tem revelado coisas bem legais. Um parêntese: uma coisa curiosa, por exemplo, é o número de mulheres que elogia a Alfa, uma revista para os homens. E eu fico pensando no dia em que não farão sentido revistas segmentadas por gênero. Fecha parêntese.

12 novembro 2011

Roubos (12)

We can't go on together
With suspicious minds (suspicious minds)
And we can't build our dreams
On suspicious minds

(Não podemos continuar juntos
Com mentes desconfiadas
E não podemos construir nossos sonhos
Com mentes desconfiadas)

Ouve aqui, ó. (na voz dele fica bom demais)

Por que motivo eu roubo ---> O Roubo número 1.

Em uma das palestras da Semana ARP da Comunicação 2011, cujo tema era "indústria criativa", os caras falaram desse livro do post Roubos (1) e citaram essa parte, especialmente. Então, eu me senti muito criativa com essa série de roubos que eu cometo. :P

03 outubro 2011

Roubos (11)

"O século 21 será das pessoas individualmente livres e voluntariamente juntas."

Será que todo mundo entende essa afirmação?

Roubei daqui.
Por que eu roubo? Tudo explicado aqui.

16 julho 2011

Todos queremos ser jovens


> Aspiracionais pra uns, inspiracionais pra outros. Aspirar e inspirar. Rende um texto.

> Identidades que transcendem o lugar onde são e onde estão. Rende um texto. (qualquer tema/assunto/fato local acomoda entrevistas com pessoas não-locais, de qualquer parte do mundo; pra muitos assuntos hj em dia, o lugar onde estamos não altera nosso acesso a opiniões e análises. No jornalismo, isso já foi mais definitivo)

> Conexões estéticas e comportamentais. Rende um texto. (conexões estéticas, por exemplo, me lembra coisas de categorias muito díspares e que têm design parecido. Tipo isso e isso.) (sobre conexões comportamentais eu penso no fato de o relevante ir para internet, mas também se originar dela, numa via de... mão dupla? mão dupla não seria algo do século passado? não estaríamos mais para lulas-moluscos, se pensarmos na nossa capacidade de alcançar e trocar coisas via websfera?)

> Modo não linear de pensar. (+) Tudo pode ser remixado. Rendem texto. (ou um não-texto. Ambas as afirmações têm a ver com esse post, sobre textos que rendem e que eu, de fato, nunca vou escrever, porque, refletindo a linguagem da internet, são muitos links se abrindo na minha cabeça. E, mesmo que eu vencesse a ansiedade que as novas ideias provocam, no final eu não ia gostar, ou aprovar o resultado, porque novas ideias iam surgir, bagunçando as primeiras, num raciocínio permanentemente incompleto, em espiral, algo confuso?, mas de fato angustiantemente sem fim. E tudo isso por causa de apenas UM vídeo. Um vídeo, bem editado, com conteúdo interessante, mas não absoluto, e que, mesmo com todas as ressalvas possíveis, estabeleceu muitas conexões na minha cabeça (e na sua tb, não?), a ponto de eu desistir de explicá-las antes mesmo de começar, exatamente como fazem os jovens descritos no vídeo: eles desistem de explicar e apenas agem. O seu pensar é o agir, que a internet e seus diversos recursos de compartilhamento oportunizam. Eles não têm um modo de pensar linear. Nem um modo linear de fazer. E isso tem a ver com a próxima afirmativa, tb tirada desse vídeo)

> É natural começar uma coisa e terminar em outra. Rende texto. (eu não sei como esse texto vai acabar. Ele não vai acabar na real. E eu não vou me preocupar com isso, porque senão sequer este post existiria. A infinidade de assuntos e insights a partir desse vídeo reflete a linguagem da internet, ou o seu jeito de ser, de mil abas e mil cliques, que vão se abrindo paralelamente... ou na verdade é a internet que, de modo espetacular, acaba por refletir as nossas conexões mentais? Uma vez uma professora que estudava o fenômeno me disse isso, maravilhada: a internet, o caminho dentro da rede, a série de links clicados permite conhecer o raciocínio feito pela pessoa que clicou aquilo. Antes da internet - ou do computador - isso era impossível).

> O normal é chato. Ao invés de neutralizar as diferenças, se tornou cult expressá-las. Rende texto. (no final das contas, querer que um texto explique tudo isso seria normalizar o não-normalizável, neh? Normalizar (no sentido de aparar as diferenças) o pensamento, quando ele fica muito mais legal bagunçado (ou mais criativo). Na raiz motivadora de quem escreve há uma pretensão de explicar o todo, encaixotando uma realidade. Leva-se tempo para isso. Muito tempo. Um tempo que não temos. Por isso, quando os intelectuais terminam uma tese provavelmente ela não serve mais para grandes coisas, porque a realidade já mudou 100 vezes. Diga o que vc tem a dizer agora, não espere encerrar o assunto, solte sua ideia, ela vai se juntar à outra, e o melhor conceito vai ser a soma de muitas).

> Unir trabalho e lazer. Rende texto. (culhão para assumir o que quer fazer na hora que quer fazer garantindo que o trabalho vai estar pronto na hora que precisar que esteja pronto, sem precisar bater a porra do ponto, nem ficar sentado o dia inteiro atrás de uma mesa, como uma samambaia)

> Catalisadores de mudanças. Rende texto (pensa nas grandes mudanças em sua vida. Quem ou que as motivou? Esse que ou esse quem, na verdade, conseguiu mobilizar a sua porção jovem. Vc a carrega pra sempre, não importa a idade que tenha. É aquilo que te tira da zona de conforto. Quando vc diz sim prum desafio, vc está sendo jovem.)

Enfim, esse vídeo rende um monte de textos, que eu não vou escrever (o outro nome disso pode ser preguiça). Porque não tenho certeza de nada. De certo modo, as certezas são coisas mortas (por que eu perderia tempo indo atrás delas aqui?).

E esse desemparelhamento entre o que pensamos e a realidade, uma coisa numa velocidade e outra coisa em outra, me lembrou uma coisa que eu escrevi aqui.
Agora há pouco, fui escrever "faço lanche" e, quando vi, estava saindo "Façhe", porque a minha cabeça foi mais rápida que meus dedos. Quando eles tavam no ç, ela já estava no che.

E o que isso tem a ver com o resto do texto? Deve ter, porque lembrei disso pensando em tudo isso que tah no post... Mas não peça explicações. Não há tempo para elas. A essas alturas, seu Facebook, seu twitter etc tem novidades e você está perdendo. Quando lembrar de mim novamente, eu já estarei em outra...

tipo, agora lembrei de uma sensação q tenho quando vou entrar na sala de cinema e cruzo com as pessoas que assistiram a sessão anterior: me sinto tipo inferiorizada... não é bem isso, mas é tipo isso... A gente sai diferente de uma sessão de cinema. De qlq experiência, na verdade, mas ali, naquele momento, isso fica muito flagrante. Eu sou a pessoa sem A experiência cruzando com as pessoas que já tiveram A experiência.

o vídeo lá em cima diz isso... necessidade q temos de filtros para organizar experiências, que são muitas a todo momento.

... e esse post não acaba mais...
desculpa. Onde eu desligo?
tchau.
tenho um monte de texto de trabalho pra fazer e tô aqui, no bLOg... (trabalho x lazer, putz, voltei pro vídeo... tah, fui. sério. fui mesmo.)

Ah!, faltou dizer que conheci o vídeo através do twitter, o que acabou me levando pra este site, que tem um texto bem legal sobre o tema, ou oS temaS.

20 junho 2011

Roubos (10)

Amadurecer é aprender a mentir.

Ser surdo, cego e mudo: essa é a opção melhor pra quem não quer participar da mentira, mas está afogado nela. A mentira é tudo e a única verdadezinha é dizer que tudo isso é mentira.

Bom, nem elas são verdadeiras. Nada, fora de nós, é. Pensa bem: a verdade existe mesmo só dentro da gente, e ela não nasce na forma gramatical, na forma das palavras. Ninguém sente “Hm, eu amo ela”, nós sentimos uma… coisa. Daí tu pega’ essa coisa nua que tem dentro de ti, põe nela umas calças de A, uma camiseta M, uma máscara de O, uma peruca de R; e cospe a representação gramatical da verdade, esse monstrinho. E se é uma representação da verdade, é uma mentira.

A comunicação não acaba na nossa boca, acaba dentro do ouvido do outro.

Não existe um Dicionário Universal, e sim um dicionário pra cada ouvido. Quem dera os ouvidos também soubessem que há um dicionário pra cada boca.

É claro que foram anos de pessoas mentindo que jantariam umas com as outras que fizeram com que fosse subentendido esse idioma da mentira que se arrasta por cima do tapete persa onde por debaixo passam, amassadas, as verdades. Mas, para o bem ou para o mal, o idioma está aí e, por mais bizarro que seja, algumas mentiras ainda comunicam verdades melhor do que verdades comunicam elas próprias.





Roubei tudo desse post no site da Perestroika.

Eu roubo porque... aqui explica tudo.


E eu não paro de cometer roubos porque não consigo mais, como antes, por ordem nos meus pensamentos. Melhor, nas minhas sensações. Condição essa que, neste post, encontrei identificação na seguinte frase:


Eu sabia que tava certo de alguma maneira, mas não sabia por quê. Ainda não sabia também que, às vezes, o ser vem antes do saber o porquê se é.

29 maio 2011

Keep on moving

Treinar é ir pra guerra.
Fazer yoga é voltar pra casa.

*

Treinar é denso.
Yoga é sutil.

*

O corpo moldado pelo treino combina com o yoga. (por q combina? não sei... tô pensando mais sobre isso)
O espaço interno aberto/expandido com o yoga acomoda as sensações do treino.

*

Tô apenas começando. E talvez nunca saia do começo quando o assunto é yoga. Mas... quero mais de tudo isso. E uma das máximas do yoga é: avançar sem querer chegar a lugar algum. (Pra isso, preciso desaprender tantas outras máximas herdadas involuntariamente ou reforçadas pelo roldão do cotidiano.) Não há chegadas, não há competições. Divertir-se com o caminho é melhor do que a expectativa pelo grau de prazer da chegada. O caminho é chegar. Keep on moving*.

falar é fácil... e isso q eu tomo o maior cuidado com as palavras.

*obrigada pelo tweet, @lulubrito! Acabou q deu nome pra este post :)

28 maio 2011

Meu nome é Luna. Pit-Luna. Mas pode me chamar de Bubis


A Luna me dá certeza de que os cães atuam numa outra sintonia.
Até bem pouco tempo eu quase caí na conversa de que os gatos são mais admiráveis do que os cachorros por sua independência e eterno ar blasé. De que os cães eram uns bobocas: não importa o que acontecesse, eles permaneciam fiéis. Que vc podia brigar com seu cão que logo em seguida ele vinha todo bobo, sacudindo o rabinho, demonstrando com isso ser... um boboca.
Nada disso. Acho os cães admiráveis justamente por isso: a total falta de rancor. A fidelidade acima de qualquer coisa. A fidelidade a algo maior. Talvez isso explique porque é sempre um cachorro que acompanha um mendigo, e não um gato. Nada contra os gatos. Eles têm poderes, respeito.
A Luna é assim de maneira imediata: vc briga com ela, vc está brigando com ela, e ela está quase que imediatamente arranhando suas pernas, pedindo colo, como que com pressa de pôr fim à discussão e fazer logo as pazes.
Essa sensação de que os cães atuam numa outra sintonia tem a ver com uma outra coisa também: eles não atendem especificamente ao nome que ganharam. Eles atendem ao tom ou à porção de carinho que vc coloca na palavra com a qual os chama. É como se o grau de carinho das pessoas queridas tivesse um código, um código de barras, que os cães registram em seu sistema. Falo isso porque costumo colocar muitos apelidos nos cachorros. Minha família toda é assim. E eles, os cães, atendem a todos os apelidos. O que me faz pensar que eles atendem a algo invisível (ou inaudível) e não exatamente à soma de sílabas frias.

A Luna é Luna, mas também é:
- Bubu
- Búio
- Lunex
- Pit-Luna
- Lunevsky
- Bubi
- Chulepinha
- Menininha
- Mixiguana
- Mixiguaninha
- Bubis

***

Se bem que... tah certo mesmo: não é o que dizemos, mas como dizemos; não é o que ouvimos mas como entendemos.

02 maio 2011

Roubos (9)

Sei que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
Mas...
o fato é que entre uma conversa sobre minuto/segundos/centésimos de série, 'n' repetições de pista, quilômetros de ciclismo com média de velocidade tal, potência de pedaladas etc etc etc e outra conversa sobre isso aqui, eu sempre vou me interessar INFINITAMENTE mais por essa última.
A entrevista do link é longa, mas acho que vale muito a pena ler o que a entrevistada diz sobre experimentar esportes/atividades físicas.
Não consigo entender treinos baseados apenas em números. Me esforço, porque vejo amigos fazendo isso, mas no fundo, no fundo, no fundo, o resultado do relógio me diz/responde muito pouco sobre o que realmente me interessa.
Acho que relógios só poderiam ser levados tão a sério como são se vivêssemos em laboratórios, tipo em "condições ideais de temperatura e pressão".

Pra mim, o que o relógio tah dizendo pode ser apenas o começo de um raciocínio, ou uma consequência entre tantas. As sensações de um treino/uma prova são muito mais importantes (e fartamente cheia de informações sobre nós mesmos). Só que dão trabalho para entender. Esse é o ponto.

Roubos (8)




24 abril 2011

Preencha a lacuna corretamente

Gosto das histórias de montanhistas. São quase sempre intrigantes. Pena que só conhecemos essas histórias quando alguma coisa dá errado, e as boas histórias ficam sempre com um final trágico.

No início do ano teve uma história dessas. A do Bernardo Collares Arantes, alpinista carioca de 46 anos que caiu quando escalava o Fitz Roy, na Patagônia argentina. Ele teria quebrado a bacia e tinha hemorragia interna. A única chance de sobrevivência era sua amiga, que escalava o pico com ele, ir buscar ajuda. E a história dela é ainda melhor: ela DEIXA o amigo pra trás, sob nevasca, desce sem saco de dormir, porque ficou com ele, vai descendo SOB NEVASCA (eu repito), passando as noites entre as fendas do cume, na neve, até que atravessa a geleira cheia de buracos. Bom, ela consegue: pede ajuda mas todos concluem que é tarde demais. Não tinha como chegar ao local devido ao mau tempo, e o Bernardo está lá até hoje.

Isso aconteceu em janeiro eu acho, mas lembrei do fato agora porque, enquanto pesquisava um outro assunto, vi num site que, em algum momento da vida, o Bernardo escreveu aquilo ali que está na imagem. Isso:

"As montanhas são uma espécie de reino mágico onde, por meio de algum encantamento, eu me sinto a pessoa mais feliz do mundo."

Aí, eu me dei conta de que eu queria dizer, sentir, escrever (escrever é mais forte do que dizer, por isso ele escreveu) essa frase. E eu me dei conta de que todos nós podemos fazer isso. Basta trocar o início.

"As (ou Os ou A ou O) ................ são uma espécie de reino mágico onde, por meio de algum encantamento, eu me sinto a pessoa mais feliz do mundo."

Como você preenche essa lacuna? Com o que? Mas tem de ser no alvo. A resposta certa, qual é pra vc? Mas seja sincero, definitivo, intenso, como o Bernardo foi. Não é a coisa colocada ali que vai dar força a essa frase, é a verdade do coração.

22 março 2011

Comer Rezar Amar

Amiga da criadora (foi a Rejane quem me selecionou no meu primeiro emprego... trabalhamos anos juntas... e, bem mais tarde, foi quem me deu trabalho qdo decidi sair desse emprego!), acompanho o Mesa de Cinema desde, bem dizer, seu nascimento. Uma ideia que agrada pela originalidade e pela overdose de prazeres: vê-se um (bom) filme, conversa-se sobre ele (ou seja, "pensa-se") e depois come-se tudo. Explico: fã de gastronomia e de cinema, a Rejane criou um evento que junta essas duas coisas. (teve gente que copiou por aí, mais uma prova de como a ideia é boa.) Um chef sempre é convidado para fazer um jantar inspirado no filme. Além disso, coquetel, apresentações e mesmo, digamos, a cenografia do lugar (das mesas à música) tb se inspiram no filme. Passam as horas e a gente nem percebe! Bom, o Mesa cresceu - como verá quem visitar seu site -, mas de tempos em tempos eu ajudo em alguma coisa, sempre quando a demanda é por texto. Então, fiquei feliz ao colaborar mais uma vez, em função do próximo, dia 25 agora, em Caxias do Sul, sobre o filme Comer, Rezar, Amar.
Parêntese: gostei bem gostado desse filme, o que ajudou muito na hora de ter ideias para compor a revista-cardápio que a gente fez. Tem uma cena desse filme, logo no início, que pra mim já valeu o ingresso quando fui assistir. E, foda-se: adoro a Julia Roberts. Fecha parêntese.
Então, a revista que a gente fez tá prontinha e vai circular no evento, entre os convidados. O que quero destacar aqui é o texto de três mulheres que colaboraram com a revista. Uma, que é "chef", escreveu sobre Comer. Outra, que é prof de yoga, escreveu sobre Rezar. E, por fim, uma psicóloga (que tem uma visão diferenciada da psicologia) escreveu sobre Amar.
Seguem os textos:

> A Roberta Horn Gomes, do Lorita Fusion Cuisine, escreveu sobre COMER:

Comer, Rezar, Amar em si é a busca da interiorização. Comer é preencher-se, dar-se, apreender. Voltar-se pra dentro exige tempo livre, "o tempo de fazer nada". É preciso tempo, dedicação. A comida: um elo com o mundo externo. Se a apreciamos, pelo menos parte de um mundo faz sentido... Comida saborosa: um passo a mais: me identifico com o mundo e quero estar nele! Comida saborosa não vem sem boa companhia. No filme, o alimento mesmo é a mesa farta de trocas, afetos, encontros.
O silêncio traz espaço para novas possibilidades, novos sabores. É preciso não copiar, é preciso se ouvir. O silenciar é o rezar no filme. Alguém que não silencia é cheio de ícones, vozes, uma comida excessivamente temperada e, por que não?, enjoativa. Por fim Amar, motivo grande. Por ele nos alimentamos, silenciamos e torcemos: que venha um prato bom! Um primo piato, um segundo, sempre bom, surpreendente.

> A Alexandra Furtado, da Casa do Yogin, escreveu sobre REZAR:

A Índia foi o segundo destino da viagem de Elizabeth Gilbert, onde por quatro meses ela se refugiou em um ashram (comunidade voltada à prática do yoga e à evolução espiritual).
A experiência de Liz foi encantadora, pois ela precisou se despir de muitos conceitos para conseguir vencer um de seus desafios: meditar. Meditar envolve prática, hora e lugar. Estes elementos ela já tinha, mas precisava remover da sua mente aquilo que mais a impedia no exercício da meditação: os pensamentos.
Normalmente não percebemos o quanto a nossa mente é turbulenta e barulhenta. Somente quando buscamos aquietar a mente é que conseguimos perceber toda a sua agitação. Gosto muito da metáfora da canoa. Imaginemos que estamos vendo uma canoa num rio, mudando de lugar a cada novo olhar, parecendo que é outra canoa que está ali. Mas a canoa é a mesma, o que faz achar que a canoa mudou de lugar é a perspectiva do meu olhar. Porém, quem está dentro da canoa percebe a mudança, experimenta o novo, ou seja, o movimento da canoa. É diferente o olhar de quem está dentro da canoa e o de quem está fora dela. Assim é a meditação. Desapegando-se dos próprios pensamentos, se obtém um estado mais refinado de consciência sobre si e sobre a realidade.
Segundo Swami Sivananda, "a mente é comparável a um jardim: assim como você pode cultivar boas flores e frutos num jardim, arando e adubando a terra, removendo as ervas daninhas e espinheiros e regando as árvores e as plantas, da mesma forma você pode cultivar a flor da devoção no jardim da sua mente, retirando as impurezas dela, a luxúria, o rancor, a cobiça, a ilusão, o orgulho etc, regando-as com pensamentos divinos”.


> E a Angelita Scardua, do angelitascardua.wordpress.com, escreveu sobre AMAR:

Para amar, precisamos dos mesmos recursos que usamos para comer: a vontade e algo/alguém que corresponda ao nosso desejo, pelo menos se quisermos fazê-lo com prazer. Não é possível comer com prazer algo cujo paladar não nos apetece. Assim também é com o amor, para amarmos com prazer precisamos encontrar alguém que queiramos desejar. Parece óbvio não? E é! Mas, se é tão claro, por que nos sentimos tantas vezes insatisfeitos com a comida e infelizes no amor? Porque nem sempre sabemos exatamente qual é a comida ou o amor que realmente desejamos. Para amar, é preciso descobrir-se!
Quem não se conhece não sabe identificar o próprio desejo, não sabe reconhecê-lo. Há quem acredite que o amor tem um cardápio, antecipado por flores e jantares românticos, e que, ao final, se degusta com meles e açúcares.
Quem pensa assim age como um cozinheiro que segue a receita famosa por acreditar que o segredo do bolo é a fórmula e não o coração. O bom cozinheiro, ao contrário, sabe que o ponto de cozimento da massa depende não apenas do forno, mas também do paladar de quem comerá. Com o amor, é similar. O enamorado que faz questão de pagar todas as contas talvez não seja interessante às expectativas de quem quer independência; o praticante do Kama Sutra pode parecer bizarro para quem só quer aconchego sob o edredom…
Para descobrir-se, é preciso amar! É a experiência que nos ensina quem somos. Numa refeição ou nos afetos, conhecemos novos gostos e desgostos, aprendemos como agradar aos sentidos. O bom amante, afinal, é como o bom comensal, ele conhece suas predileções, mas prova novos temperos se lhe parecerem adequados ao apetite. Que tipo de amor e de amante você quer? Se não souber a resposta, corre o risco de pedir o prato errado ou de se enfastiar dos sabores já vividos.

12 março 2011

Roubos (7)

Esse vídeo não é novo. Demorei a me dar conta de que era um Roubos! E um Roubos que, de certa forma, fala justamente sobre Roubos!

http://www.youtube.com/watch?v=g6tgH2dWx5c&feature=youtu.be&a


Por que roubar? Aqui.

02 março 2011

Roubos (6) - "especial"

Não fosse o criminoso atropelamento de ciclistas aqui em Porto Alegre talvez esse Roubos nem existisse. Esse Roubos veio do livro do antropólogo Roberto DaMatta, que li em função de um trabalho e agora parece ter mais relevância do que nunca.
Chama-se Fé em Deus e Pé na Tábua - Ou como e por que o trânsito enlouquece no Brasil (Editora Rocco). A expressão do título se refere ao fato de que vigoraria, no trânsito (ou no espaço externo a nossa casa), uma ideia de que é preciso uma certa proteção divina. Como as pessoas não confiam nas regras ou não confiam que as pessoas vão segui-las, o negócio é acelerar e seja o que deus quiser.
Na real, o DaMatta diz que o problema central é transferir para o outro a responsabilidade que é nossa... E q tb tem a ver com a ideia de que seguir as regras é coisa de babaca, bobo, pouco esperto. É evidente que, se todo mundo pensar que a regra não é para si e sim para o outro, nunca a regra vai funcionar. Então, lá embaixo, estão algumas das considerações do DaMatta sobre o jeitinho de pensar do brasileiro em geral.

***

Ontem, eu fui à manifestação de repúdio à violência explícita do caso do criminoso atropelamento dos ciclistas. Fui por várias razões, mas nenhuma tem a ver com senhor que causou o atropelamento. Não caminhei duas horas pelas ruas da Cidade Baixa e do Centro, até a prefeitura, contra alguém em especial. Mas a favor de uma ideia mais ampla. Não acredito numa cidade que só pensa em carros. Ponto. Mudar isso não é fácil, e a gente precisa começar de algum jeito. Talvez caminhando, como ontem, em meio a milhares, recebendo apoio de tantos outros que se limitaram a assistir (acenar, aplaudir...) das janelas dos apartamentos, das calçadas, do parapeito dos viadutos.

Talvez eu tenha ido porque li DaMatta, e entendi o quanto é urgente a gente se dar conta de que o brasileiro não é o outro. Sou eu tb. Como ele disse (não no livro, mas na palestra que assisti), vivemos um momento especial: a sociedade está descruzando os braços. Descolando a bunda da cadeira. Talvez sobrem mais gritos do que conquistas efetivas, mas ainda assim vale mais a pena do que não tentar. Tá ficando feio não tentar, entende? Bonito é tentar.

E ainda sobre o atropelamento... fiquei pensando no fato de que todo e qualquer ato social - do mais amoroso ao mais violento - representa a sociedade inteira. Uma coisa não existe se ela não está antes no imaginário coletivo. Tipo.. inconsciente coletivo, sabe? É como se cada um de nós carregasse um tantinho daquele estranho sr.atropelador. É duro pensar assim, mas é. Daí, eu espero que todas as boas energias da caminhada de ontem tenham de alguma forma anulado as más vibrações do atropelamento.
Tudo o que se desejou de bom ontem tb está em cada um de nós.
Zero a zero. Bola no centro. Vamu pro jogo de novo. A gente sempre pode recomeçar melhor do que antes.

***
Enfim, o Roubo da vez:
O QUE DIZ DAMATTA no livro Fé em Deus e Pé na Tábua - Ou como e por que o trânsito enlouquece no Brasil (Editora Rocco):

"Nossa principal contribuição é tentar democratizar a rua, fazendo com que ela, tanto quanto a casa, seja submetida a um código igualitário - ponto capital de toda sociedade republicana, liberal e democrática."

"Qualquer legislação está destinada ao fracasso caso a sociedade que a recebe dela necessite ou esteja preparada para suas inevitáveis implicações disciplinadoras."

"... pode-se sugerir que o tão propalado processo de modernização tem como centro um diálogo (áspero, violento, nervoso ou tranquilo) entre costumes ou padrões de conduta, como diziam meus professores de antropologia - regras inscritas no coração, como diziam Rousseau -, e leis escritas, ou seja, normas consciente e explicitamente feitas como remédio, receita ou resposta para certas situações e práticas sociais."

"... temos problemas com estilos nos quais os laços sociais (ou as situações) estejam fundados na horizontalidade, cuja expressão mais clara é a igualdade de todos perante uns aos outros ou a alguma coisa."

"A sociedade, com seus costumes, culpa - numa dialética autorreferenciada que previne a mudança - o Estado e o governo pelo que ela, obviamente, também não quer fazer."

"Mesmo com o fim da escravidão, persiste essa aguda consciência de lugar e de posicionamento social. Quem se pensa como sendo socialmente inferior sente-se, em certos lugares, como um transgressor. O terror de ouvir 'isso não é lugar para gente de sua laia, raça ou posição social!' corresponde à conjunção moderna de ter o direito de ir aonde quiser mas, não obstante, continuar preso a posições socialmente vistas como subordinadas."

"Na base dessas recorrentes expectativas de superioridade social que implicam um movimento irresistível de rebaixamento dos outros e que permanecem fiéis a uma imagem hierarquizada da sociedade, estão congelados séculos de desigualdade - não apenas como uma consequência (ou resultado) da exploração econômica e política planejada, mas, sobretudo, como um modo de ordenar o mundo que ainda não foi devidamente criticado ou até mesmo percebido em suas implicações sociopolíticas."


"Nossa tese é a de que é preciso ter em mente o encontro que a modernidade e a democracia promovem entre hierarquia e igualdade para se entender o estilo pelo qual nós, brasileiros, construímos nosso espaço público e nele trafegamos."

"Tudo se passa como se, no Brasil, não tivéssemos feito a necessária transição entre obedecer a pessoas e à lei, o que configura coisas muito diversas. "

"... quem está no topo ou no fundo não precisa seguir normas, como é típico de sociedades aristocráticas, onde canalhas, celebridades e nobres (que vivem desafiando o sistema e seguem - ou tentam seguir - regras próprias) têm algo em comum: o notável desdém pelo que só os inferiores ou subordinados devem obedecer."

"Tamanho, força, poder, preço, beleza, limpeza, conservação - tudo enfim que, no Brasil, se traduz como 'aparência' determina um istema no qual o condutor do veículo tem um lugar central no trânsito e o pedestre, um lugar secundário e inferior."

"O fato concreto é que o trânsito põe a nu nossas receitas herárquicas e sua inaplicabilidade no mundo moderno."

"Tal constatação nos leva a um reiterada e inevitável discussão daquilo que, para nós, é certamente a maior contradição da vida moderna brasileira. O encontro complicado, que já chamei de dilema, de espaço público construído como igualitário, mas sobre o qual condutores de veículos e pedestres atual com expectativas hierárquicas. Um palco desenhado para cidadãos que, entretanto, nele atuam como aristocratas."

"Observamos que o uso do verbo 'respeitar', aplicado a sinais, pessoas, pedestres e outros veículos no trânsito, revela o lado indeciso de uma sociedade que se recusa a encarar a igualdade como um princípio central da democracia e como o único valor capaz de ordenar certas situações da sociedade moderna."

"Entre a visão popular, segundo a qual obedecer é um sinal de inferioridade, e a visão aristocrática ou de elite, para quem o desobedecer é uma rotina que define os superiores e mandões, reside a indecisão e a impunidade como valores fundamentais do sistema."


Por que roubar? Explicação aqui.

29 janeiro 2011

Roubos (5)

Às vezes, umas perguntas surgem lááááá no fundo. No núcleo. No meio do caroço. No meio da semente. No recheio. Lá, bem dentro da gente. Um lugar tão doido, tão doido que é por isso que fica lá, bem no fundo. Um lugar que se comporta geologicamente. Ora como um vulcão (de tempos em tempos, entra em atividade), ora como placas tectônicas (e sabe-se lá que tsunami vem daí...), ora como... sei lá.
Daí surgem as perguntas. Ou a pergunta. Às vezes, é uma só. E ela fica lá, pairando no ar, pendurada no teu varal mental. Ou guardadinha numa gaveta do inconsciente. Vc não sabe, mas está sendo movido por essa pergunta. Parece que a pergunta surgiu sem importância, vc se distraiu um pouco com ela e deixou pra lá. Vc não consegue associar de imediato que seus movimentos estão, no fundo, a serviço da busca por aquela resposta. Vc quer a resposta. A pergunta tem uma, sabe que tem uma. Elas, a pergunta e a resposta, se viram lá no fundão, lá no meio do caroço, se conhecem, viviam lá, mas se desencontraram na erupção. Emergiu só a pergunta. O fundão sabe que elas podem se achar novamente. Por isso, você não esquece a pergunta, e lembra dela quando (re)conhece a resposta.
Quanto tempo leva para a resposta (re)nascer?


***

O roubo do título deste post está aqui, ó, do livro OSHO - Meditação, a primeira e a última liberdade. (Obrigada, Mangla!):

"Aprenda a fundir corpo, mente e alma. Descubra maneiras de funcionar como um todo, por inteiro. Isso costuma acontecer com quem corre. (...) os corredores muitas vezes têm uma vivência muito forte de meditação. E se surpreendem, porque não era isso o que estavam procurando - quem pensaria que um corredor iria ter uma experiência divina? Mas acontece. Vc já correu por esporte? Gostava de correr de manhã bem cedo, quando o ar fresco e puro, quando o mundo inteiro desperta de uma noite de sono para um novo dia? Vc estava correndo e o seu corpo funcionava harmoniosamente, o ar estava fresco, o mundo renascia, vc se sentia tão vivo... Chega um momento em que o corredor desaparece e só a corrida permanece. O corpo, a mente e a alma começam a funcionar juntos e, de repente, ocorre um orgasmo interior.
Alguns corredores já tiveram acidentalmente a sensação dessa quarta dimensão, turiya. Pensam que foi só por causa da corrida que o momento lhes pareceu tão belo (...)
(...) Nunca se torne um especialista em corridas. Continue sendo um amador para não perder a capacidade de se manter alerta. Se, em algum momento, vc achar que a corrida se tornou automática, pare de correr e experimente nadar. Quando a natação se tornar automática, experimente a dança. O importante é lembrar que o movimento é apenas um pretexto para criar a percepção. Enquanto estiver criando percepção, o movimento será bom. Caso contrário, não terá mais utilidade. Passe para outro tipo de movimento em que seja preciso permanecer alerta. Nunca deixe que uma atividade se torne automática."

Por que roubar? Explico aqui.

É uma Brastemp

Esse vídeo foi "o" assunto do dia no twitter. E acho que tem a ver com o post anterior, no qual eu contei um pouco do que ouvi durante a Semana ARP da Comunicação, onde, entre outras coisas, se falou/conversou sobre o futuro das marcas. E eu contei ali da necessidade da verdade. Da necessidade de as marcas/empresas fazerem mais do que dizerem que fazem. E associei tudo isso a uma postura mais ética ou a um conjunto de valores/virtudes. É certo que sim, mas o que força as marcas e as empresas a reverem suas condutas não é necessariamente suas consciências, não é necessariamente o deitar-a-cabeça-no-travesseiro-e-dormir-tranquilo. É isso que, de modo macro, se está cobrando sim, mas, na prática, o que ajuda a tornar a ética, a verdade um bem de qualquer negócio hoje é simplesmente o fato de que nada mais fica escondido, nada mais fica entre A e B. Tudo fica conhecido. As redes sociais vivem da transparência.

O vídeo.
http://www.youtube.com/watch?v=riOvEe0wqUQ&feature=youtu.be&a

Fica claro que algum estrago na imagem da marca isso deu. Mas quanto? Fica claro que isso vai movimentar a empresa internamente. Parece que algo, alguém ou algum processo dentro da empresa não está, na prática, alinhado ao que a marca promete quando fala de si. O que isso tem a ver com a gente? Se coloca no lugar do funcionário. E pensa no teu trabalho/na tua profissão. Não há mais espaço ou tolerância para quem trabalha sem acreditar no que faz. Porque, se tu não acredita no que faz, não entende, não veste a camisa, uma hora tu relaxa, se larga, faz as coisas "nas-coxa". E isso, mais do que atrapalhar a empresa, nossa, isso vai te comendo por dentro, vai te estragando por dentro. E disso que se falou na Semana ARP. Um dos que melhor falaram disso foi o Anselmo Ramos, da Ogilvy. Abaixo, alguns trechos dos hábitos/virtudes/atitudes que ele acha que precisam ser fomentados todos os dias:

Coragem
Coragem é o mais importante de todos, impulsiona todos os outros hábitos. O medo é o pior dos vícios. O que não falta na nossa indústria é cérebro. O que falta é coluna vertebral, gente que faça acontecer.

Idealismo
É preciso haver propósito, um ideal. Se você trabalha em um lugar e não sabe qual é, cobre. Só o dinheiro não se sustenta como ideal. Temos de acordar todo dia e saber por que estamos indo trabalhar.

Desdenho pela mediocridade
A gente acorda todo dia e tem uma escolha: se vai ter um dia médio ou não-médio. É uma escolha.

Sinceridade
A importância de ser brutalmente honesto. O tapinha nas costas atrapalha o trabalho. Deixar de falar o que a gente realmente pensa é mais fácil. Se falar, gera desconforto, raiva, mas é o melhor a longo prazo. É melhor ter uma conversa desconfortável do que fazer de conta que está tudo bem.

Intuição
Às vezes, a gente precisa de números demais, o tempo todo, para confirmar o que já sentimos como certo. Temos de ouvir mais a voz interior. Carl Young dizia que intuição é a percepção via inconsciente.

22 janeiro 2011

Dimensão espiritual

Olha essas frases:

1. "O sal da vida são as diferenças, conhecer as pessoas... A diferença alimenta a generosidade. Amar o outro. Enxergar o outro como alguém tão importante como a gente."
2. "As pessoas têm de aprender umas com as outras."
As pessoas não devem ter medo de falhar. Falhar, fazer errado e começar de novo faz parte da vida."
3. "No fundo, nosso maior medo é ser poderoso demais. Nossa luz interior é que dá medo. Não são as trevas. Nos perguntamos: 'por que eu vou ser brilhante?' Mas devemos pensar: 'por que não podemos ser?'"
"Se comportar de maneira pequena não ajuda o mundo, não inspira o mundo. Seu maior diferencial competitivo é ser o que você realmente é."
4. "A mensagem que tenho a dar é... sei lá. Sei lá significa não ter certezas."
5. "A diferença entre o bom e o positivo é que - embora ambos se refiram a alguma coisa boa para você e para o outro -, no positivo, esse resultado é duradouro."

Onde você acha que eu tive contato com essas frases?
a. ( ) num livro do tipo Osho... tipo física quântica... tipo, sei lá, Paulo Coelho...
b. ( ) em palestras de um centro espírita kardecista
c. ( ) durante um curso motivacional
d. ( ) em palestra de um guru budista
e. ( ) nenhuma das anteriores

A resposta é letra E. Mas podia ser qualquer uma das anteriores. Foi isso que me intrigou. "O que está acontecendo aqui?", eu me perguntava enquanto assistia aos palestrantes da Semana ARP da Comunicação. Foi no início de dezembro e, desde os primeiros dias, tive vontade contar aqui o que ouvi lá.
Os temas das palestras, como não poderia deixar de ser, focavam os desafios da comunicação, do marketing, da publicidade, das marcas. A novidade? A tendência? Ser verdadeiro. Fazer as coisas com uma intenção genuinamente transformadora. Com amor. Com presença, e não mecanicamente. É a "dimensão espiritual", ouvi várias vezes.

Não é incrível?
E não te parece óbvio que falar de marcas é falar de pessoas? Poderá uma marca ser uma coisa e as pessoas que a fazem, que a são, serem diferentes? Mesmo numa visão mais ousada: somos marca também. Seja como for, a "novidade", o desafio é deixar as marcas mais humanas, e daí vem uma lista de virtudes jamais pensada no modelo tradicional de fazer negócio. A novidade é essa: não há uma vida profissional, outra privada. É tudo uma coisa só. O que vc é como pessoa é como sua marca vai ser. O que vc faz pras pessoas, nas suas relações pessoais, é como vc vai fazer na profissão. Os muros caíram. E fica cada vez mais evidente quem é canastrão, ambíguo (?) ou tem um caráter questionável.

E, agora, olha essas ideias:

6. "O pensamento gerencial evoluiu de uma gestão de produtos, nos anos 50 e 60, para a de clientes, nos anos 70 e 80, depois para a de marcas, até 2000, e agora vivemos a gestão dos valores. Ou, numa outra forma de ver essa mudança de conduta, o seguinte raciocínio: evoluímos do foco mental (ideia de rentabilidade, de ser melhor) para o foco do coração (aspiracional) e, então, chegamos à postura focada no espiritual, que carrega uma ideia de compaixão, de fazer diferença quando beneficia o todo para sempre."
7. "As marcas têm de ser reconhecidas pelas coisas que fazem, e não pelo que dizem que fazem. A fórmula é essa: fazer > dizer, ou seja, fazer é mais importante do que dizer que faz." Como disse o Simon Sinek no vídeo que nós mostramos lá: "O objetivo não é fazer negócio com pessoas que tenham dinheiro para comprar o que você oferece, mas com as pessoas que acreditam no que você acredita". A lógica da comunicação contemporânea, e o que as redes sociais estão mostrando, é que existe uma dimensão espiritual...

Eu adorei tudo. Porque, para mim, um discurso algo "divino", "cristão" (no melhor e mais limpo sentido do que significou a energia de Jesus, de Buda, de Zaratustra ou outros, não importa, avatares de uma energia afim, do bem e poderosa) está tomando conta do mundo, vindo de várias direções, com diferentes "embalagens", mas essencialmente uníssono. Cinema (Avatar? Tropa de Elite? Chico Xavier?), arte, comunicação, política (Marina?), religião (mais liberdade) ou tudo isso resumido em uma palavra: autoconhecimento para evoluir... o recado está sendo dado. Quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir? Quem se importa, se empolga, se emociona, se alista nesse exército? Como me disse o Fred Gelli, outro palestrantes da Semana ARP com ideias altamente sensíveis:
"Tem pessoas pensando essas coisas, outras meditando, outras conspirando, outras executando, enfim, sintonizados de alguma forma com esse novo olhar, essa nova atitude. De fato, é um outro modelo mental".


O canastrão, ou o lado negro das coisas, das virtudes, talvez não deixe de existir. Mas a ideia não é essa. A ideia é tudo vir à tona. Como sugerem os textos do Osho: qdo você acende a luz, a sujeira aparece. Não temos como acabar com a escuridão, mas podemos acender mais e mais luzes. De resto, a natureza se encarrega, como diria o Fred Gelli: mutações e a evolução natural.

Sei lá. Cada um com suas viagens. O tempo dirá.
Se não for nada disso, pelo menos me rendeu um texto. :) Tô feliz que ele nasceu. Fazia tempo que queria contar da Semana ARP aqui.

Em tempo: o tema global da Semana, este ano, ou seja, o guarda-chuva sob o qual tudo se abrigou foi "O novo Brasil". A ideia da dimensão espiritual favoreceria o país. Segundo alguns palestrantes, o país tem uma afinidade com essa nova mentalidade.
enfim... o Brasil é o país da hora. E não por acaso.
para ilustrar, um textinho q fala sobre a hora e a vez do Brasil (coincidentemente, de um publicitário): aqui.
Esse outro aqui também se alinha ao "novo Brasil".


*Então, para creditar tudo, aí vão os autores das frases/ideias:
1. Roberto DaMatta, antropólogo
2. Alessandra Lariu, diretora de criação digital da McCann Erickson NY (a ideia do "viver in beta" é muito Osho!)
3. Anselmo Ramos, VP de Criação da Ogilvy Brasil (falou de intuição também)
4. Arnaldo Jabor, comentarista político e cineasta
5. Paulo Lima, dono da Trip Editora
6. Philip Kotler, consultor de marketing (o papa do modelo tradicional americano falando de dimensão espiritual? Incrível...)
7. Perestroika (linkei eles aqui.)

E ainda faltou contar tanta coisa... aiai.

Abaixo, links afins com essa história toda:

http://www.videolog.tv/video.php?id=460283
http://www.abstratil.com.br/category/branding-3-0
http://criaglobal.com/how/
http://www.creativesocialblog.com/advertising/small-is-beautiful
http://www.blog.sambabusiness.com.br/samba/index.php/bem-vindo/60-livros/625-rework-de-jason-fried-e-david-hanson

10 janeiro 2011

Com fome, com sede, algo assim

De repente, eu notei que precisava daquilo. Por algum tempo, empurrar pro lado tudo o que ainda tinha de fazer - afinal, sempre vai ter algo pra fazer - e abastecer parte de mim que estava esvaziando, com fome, com sede, algo assim. Uma parte que não tem a ver com o meu corpo físico (e eu acho que nem com o mental...), mas que precisa de atenção e de atividades, que precisa ser alimentada tanto quanto ele.

Então, fui pro shopping! :D

Melhor dizendo, fui passear numa livraria. Folhear revistas, olhar os livros, tocá-los, caminhar entre as mesas e prateleiras, sem procurar nada específico, apenas permitindo que o olhar fosse ele mesmo, como um cachorro de rua, sem guia. Mas não cachorro de rua com olhar pidão. Cachorro de rua feliz, sabe? Aquele que atravessa a rua e cheira aqui e acolá como se soubesse exatamente de onde veio e pra onde vai. O dono do pedaço.

E as boas livrarias, hoje megalojas, têm espaço de café, e o cheirinho dele sendo feito na hora deixou tudo mais prazeroso. Quanto tempo eu fiquei ali? Meia hora? Quarenta minutos? Uma hora? E quanto tempo demorou para que uma certa sensação de impotência fosse percebida em mim? Um dó ao constatar o tanto que há para ver, ler, conhecer...

É muito grave a gente levar uma vida que quase não encontra tempo para isso? Não me refiro a ler. Tem gente que tem o hábito de ler todos os dias. É como almoçar e jantar. Mas eu me refiro a mais do que isso, a mais do que atitude mecânica, habitual. Eu me refiro a uma entrega. Se relacionar com os livros. Viajar na batatinha com cada um deles. Quem consegue, todos os dias, na mesma hora, como um relogiozinho, mente e alma limpas para entrar nessa? Já não se consegue direito nem com as pessoas com quem convivemos, imagina com objetos! (estranho pensar livros como objetos... não os sinto assim). Tudo tão superficial... E é superficial porque é difícil mesmo o contrário disso.
Então acontece de eu ver sobrar umas horas do meu dia para eu pegar o livro, mas pegar o livro e começar a ler é uma coisa; pegar o livro e me relacionar com ele intimamente é outra coisa. Precisa de energia. De um tipo de disposição e energia que são especiais, e não ordinárias.
E desse dó que eu tô falando: vai faltar tempo com essas condições ideais para ver tudo o que há para ver nesse mundo. Ai, que dorzinha que me dá. Fazer o q?

Pois nesse passeiozinho de minutos, eu me entregaria curiosa e por completo a pelo menos três livros: O Andar do Bêbado (Leonard Mlodinow), Solar (Ian McEwan) e História da Beleza (Humberto Eco).
Embora meio saturada de torturas mentais, acho que sucumbiria também à biografia de Clarice Lispector. Acho que ela é a deusa maior dos atormentados, com mentes e/ou corações que se debatem procurando o sentido das coisas - e isso é o que ela tem de melhor e de pior.

Levaria ainda algumas revistas de decoração, outras duas femininas e uma sobre bike.

Notei que muitos lançamentos, expostos nas primeiras gôndolas, têm seus títulos começando com "O Segredo de...", "Os segredos para...". Nossa, pensei, pelo jeito se acabaram os segredos do universo, tudo já foi revelado.

Vi que o Eduardo Bueno continua escrevendo sobre o Brasil... Lá se vão, pelo menos, 8 anos? 9? O que terá mudado desde o primeiro que resenhei ainda para ZH?

Vi que o Justin Bieber, o Fiuk e o José Alencar têm livros - biografia, diário e biografia, respectivamente. Vi também que educar cachorros parece ser uma grande necessidade: há uns 10 títulos diferentes sendo exibidos como novidade.

Vi que o espaço para títulos sobre espiritualismo está cada vez maior e não mais escondido lá no fundo.

Vi, especialmente, que os livros estão cada vez mais lindos. (*suspiro*). Ai que dó de não levá-los comigo. Já contei que eu tive um profe na Fabico que dizia que a gente nem precisava ler os livros, apenas tê-los por perto? Eu concordo. Não faz o menor sentido, mas eu concordo.

E, diante dessa beleza toda, lembrei da coluna do Sant'Ana de ontem, que li por acaso, diga-se de passagem. Ele falava sobre como existem jornalistas/escritores com espaços nobres por aí e que, no fundo, não dizem nada. Escrevem mas não arrebatam seus leitores.
Então, na livraria, fiquei imaginando quanto de ideias, raciocínios realmente interessantes poderia haver por trás de tanta beleza. E, já que o assunto é texto, quer ler um bom texto? Vai aqui, no blog do Tião, e lê o que tem data de hoje.

Da livraria, quase levei este e muito mais este. Mas não. Já tô com um outro, nessa mesma linha, para ler em casa. Então, com esforço, os devolvi à prateleira e pensei "fica pruma próxima", "a gente se ama, mas nossas agendas são incompatíveis no momento". :)

Para amenizar a minha dó, saí da livraria com uma revista Yoga Journal e o último do Roberto DaMatta (Fé em Deus e Pé na Tábua - Ou Como e Por que o Trânsito Enlouquece no Brasil) - este último mais por uma demanda de trabalho do que um desejo de fato. Mas sei que DaMatta é sempre DaMatta e um pouco do antropologia não faz mal a ninguém.

05 janeiro 2011

Deus é um designer fodaço

Um amigo designer me escreveu meio desolado... Ele fez um logo para um outro amigo meu, e o logo ficou bacana, eu achei. Havíamos comentado sobre a leveza e a fluidez do lettering, características que combinavam com aquilo para o que o logo estava sendo feito, enfim. Daí ele me conta que o outro meu amigo pediu umas alteraçõezinhas... tipo... "quem sabe usar a letra desse outro logo aqui?" (um logo bem ultrapassado, pra dizer o mínimo)... e... "esse I aqui, meio tortinho, não pode ficar reto?".

Acabou com o logo.

E não foi por mal. A falta de noção ao pedir "alteraçõezinhas" que destruíram o trabalho do meu amigo se dá por cegueira mesmo. Involuntária.

O design ensina a olhar. Educa o olhar. (no sentido de ampliar, iluminar) Mas a gente tem de estar disposto. Caso contrário, não aprende, não expande, não acende a luz.

Claro que um logo pode desagradar, mas antes a gente precisa pensar se olhou direito. De imediato, a gente só vê o que já conhece. Narciso acha feio o que não é espelho. Por isso a necessária disposição (e um certo tempo) para olhar o que nunca viu antes (mesmo que, à primeira vista, pareça que já viu). Sem essa disposição, não vai ver nada. Vai olhar sem ver. Ou vai ver só até onde seu banco pessoal de experiências alcança (emendando um "não gostei", na maioria das vezes).

De novo: claro que um logo pode desagradar, prometer a luz, a expansão e não cumprir. Mas isso não é problema de quem olha, é problema de quem fez o logo. Quem olha precisa ter certeza de que a disposição para ver estava ali, ou seja, ele procurou a luz, ficou na ponta dos pés para ver até onde o simbologia ía... se nada encontrou, a "culpa" pode não ser só dele. (chama o pajé!)

Um logo pode imprimir um estilo pra coisa que requeria o logo tão significativo e contundente que a coisa nem imaginou que poderia ter/ser.

Por coincidência (numa escala macro, é verdade), aconteceu algo parecido com a marca Rio2016. Tão logo foi conhecida, no Réveillon do Rio, surgiram suspeitas de plágio - numa rapidez que depõe contra quem estaria realmente disposto a olhar primeiro.
Pessoalmente, achei lindo o logo feito pelo pessoal da Tátil Design. Eu, meio anestesiada pelo belo, curiosa para olhar, à espera do convite para olhar, não dei muita atenção à bateção de panela que foram as declarações de plágio. Estava deixando pra ver isso depois... rsrsrs
Em seguida, veio a resposta dos autores. E, mais do que explicações, vieram as reações das pessoas, o primeiro contato com o logo-escultura, e ficou constrangedora de tão inadequada a acusação de suposta "cópia" da marca Telluride Foundation.
Ainda que os logos em questão se assemelhem, por contingências que eu nem saberia apontar aqui, o do Rio2016 é tão mais rico, se desdobra para tantas outras formas, tem tanto mais conteúdo e possibilidades, e principalmente isso é tão a própria razão de ser do logo (muito mais do que a forma da mancha que ele assume no papel) que, eu ousaria dizer, o fato de as pessoas estarem dando as mãos ou não ficou em segundo plano. Ainda que fosse uma cópia, uma inspiração (vamos imaginar/conjecturar*), a marca olímpica é um salto qualitativo sem comparação.

E essa coisa do 'aprender a olhar' me lembrou um trecho do filme Quem Somos Nós que considero muito significativo. Tah, ok, o filme é até meio tosco, cinematograficamente falando, mas seu conteúdo é um tanto intrigante. Pois nesse trecho do filme alguém conta que as caravelas vindas de Portgual e Espanha não foram notadas pelos índios que aqui viviam na América, mesmo quando já bem próximas da orla. Os índios percebiam que as águas do mar estavam agitadas de uma forma diferente e não entendiam por quê. Daí, no filme, isso se explica assim: os índios não podiam ver o que não conheciam.


Tah, não sei se isso dos índios é verdade. Mas a questão é a mensagem disso. Como uma parábola. Se a mensagem se acomoda no teu íntimo ( no coração? na alma?), é porque há uma verdade nela.

Os índios só passaram a ver as caravelas quando o pajé - o professor da época, dotado da confiança dos demais - analisa a questão e explica. Os índios procuraram alguém em quem confiavam e aprenderam a olhar.
(a gente se dispõe a olhar com mais facilidade quando confia)

Talvez esteja faltando confiança entre esses meus dois amigos. Talvez o primeiro tenha de explicar o seu logo, mostrar que está ali tudo o que o segundo amigo pediu. Se é que pediu. Se o segundo não sabe bem para que quer ter um logo, o buraco é mais embaixo.

Pra encerrar, outra coisa que lembrei nessa história toda. Uma frase que li na orelha de um livro do Eduardo Galeano. Acho que já falei dela aqui (nunca li o livro, mas a frase valeu muito). É assim: o menino enxerga uma paisagem embasbacante, no alto de uma colina, e, maravilhado, pede ao pai dele:
_ Pai, me ajuda a olhar.


Que "responsa" do pai, neh?
Pai, aqui, é pai mesmo ou pai, aqui, é Deus-Pai? (ou um designer fodão hahaha) Podia ser ambos, neh? Afinal, seguido eu peço para Ele lá em cima, diante de uma situação nova/complexa: "Pai, me ajuda a olhar!"
Deus é um designer fodaço.


Em tempo: esse meu amigo designer não gostou do logo do Rio2016. Não sei se ele teve tempo de olhar mesmo. Mas, se é seu trabalho/ofício, creio que não responderia qualquer resposta quando perguntei, neh? Mas, se ele não se dá tempo para olhar, talvez então esteja, através de meu outro amigo, provando de sua própria imprudência. Ou ele não gostou mesmo do Rio2016 e ponto.


*Se fosse verdade o plágio, isso seria muito louco e decepcionante... basta pesquisar um pouco sobre a Tátil... Esses tempos entrevistei o Fred Gelli, um dos donos desse escritório de design, e foi bastante inspirador. Até para os treinos! Em breve, vou tentar explicar isso num texto aqui, mas preciso de garantias de que ele não vai ficar piegas! ;)

Bem juntinhas

Bem juntinhas
eu e a Búio