Muitas vezes, não são as idéias que estão na minha cabeça, mas sim, já prontas e inteiras, as frases, os parágrafos completos, encadeados, com sentido. Aí, sem fazer barulho, sem desviar a atenção para nada, saio pé por pé, mas não adianta. Basta eu pegar a caneta ou buscar as letras no teclado, basta uma folha de papel ou a tela em branco do computador na minha frente para tudo desaparecer. Como se o vazio do suporte – papel ou tela – se olhasse num espelho.
Como se as frases antes ali fossem clandestinas, e a presença do papel e da tela, alguma forma de oficialidade repressora, de autoridade censurante. Como se as frases fossem algo selvagens, escondendo-se da civilização. E, aí, como o homem branco se aproximando de uma tribo acuada, minha consciência tenta convencer as frases a voltarem, a deixarem a sombra dos arbustos. Elas vêm, receosas, mas vêm. Cheias de pudor, mas vêm. Diferentes a ponto de comprometer a essência, mas vêm. Não têm a mesma vivacidade, espontaneidade da primeira vez em que as conheci, quando brincavam livres de mim.
E tenho de me contentar em pôr no papel ou na tela apenas o que foi possível, o que a oficialidade conseguiu. Fica a impressão de que traí minhas próprias idéias, ou que estou enganando o leitor. É muito grave não conseguirmos contar tudo? Para quem tenta, é. Mas que idéia é livre no papel? Que texto escrito não é uma escolha para a consciência e, então, uma forma de prisão para as idéias?
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