30 abril 2010

O curta da família Luz

E como se fizéssemos parte de um daqueles curtas da RBS, filmados no Litoral e exibidos ao meio-dia de sábado, lá estávamos os 8 reunidos.
Meu irmão mais velho, seu filho e minha irmã gêmea dentro do mar, na beirinha, mas dentro; ele fazendo o que era preciso fazer, o que havíamos combinado de fazer, e ela rezando, ao seu modo. Meu pequeno sobrinho parecia imitar os gestos de seu pai, também dentro d'água.
Na areia molhada, mas onde a onda não chegava, eu abraçada à minha mãe, ou melhor, eu amparando o choro de minha mãe. Eu chorava há algum tempo tb.
Minha sobrinha, q depois de se emocionar abraçada a sua mãe, minha cunhada, veio se juntar a nós;
E meu irmão mais novo, um pouco afastado, ao nosso lado, olhos fixos no mar, não sei se chorou, mas ganhou o abraço da esposa, que se chegou de mansinho.
Na frente, mar, pra esquerda um caminho sem fim, pra direita idem, para trás cômoros, ventava um pouco, havia muito silêncio e um pouco de frio. Estávamos além de Quintão, em frente a uma capelinha, referência do local onde meu pai e meus irmãos costumavam pescar nos anos de veraneio.
Tenta imaginar essa cena de longe, não te parece um curta gaúcho?

Minha família inteira ali. Podería-se dizer que não éramos 8, mas 9. Meu pai era o motivo daquela reunião: suas cinzas estavam sendo jogadas ao mar, 10 anos depois de sua morte. Mas qual era o motivo de o Universo ter juntado essas almas nessa vida?
Não sei os motivos pelos quais as outras pessoas ali choraram, mas eu acho que não chorei de tristeza. Talvez nem tanto de saudade. Pensei em meu pai, acho que rezei, pedi que estivesse bem. Mas me distanciei dali, me coloquei em frente a "essa TV que exibe um curta gaúcho", e chorei por me sentir tão estranha àquelas pessoas as quais estava para toda a vida ligada. Nunca entendi por que, e acho que não sossseguei de entender ainda, mas a afinidade com minha família é algo q está sempre sendo perseguido, ou seja, ela não existe. E eu me ressinto disso. Me senti só e ao mesmo tempo parte de algo. Com meu pai era diferente, mas como estaria sendo agora? Teríamos mantido a afinidade? Teria eu contado a ele tudo o que não consigo falar pra mãe e irmãos?

A cena triste, algo mórbida, estava estranhamente cheia de vida, de humanidade. Onde há emoção é que a vida (humana) está. Tenho certeza de que a emoção, saber lidar com ela, é o próximo passo evolutivo do homem. O que são os seres celestiais (condição que é destino de todos nós segundo praticamente todas as religiões), senão seres capazes de lidar com o que sentem e escolher o que querem sentir? E se a perspectiva te parece fantasiosa, olha pra trás então: os animais. O que nos faz diferente deles? A capacidade de pensar sobre o que se sente. E o que fazemos com isso? Pouco, muito pouco. Ou ao menos fazemos coisas ainda maculadas por resquícios de nossa natureza animal/instintiva. E só. Os chamados 'nobres' sentimentos são para poucos.
Há quem prefira a vida mais perto da animal, com seus prazeres bem fartos, materiais, carnais. Mas eu acho que a emoção é uma arma poderosa com a qual não sabemos lidar completamente ainda - ou seja, desconhecemos suas possibilidades de satisfação, realização e plenitude. Não sabemos lidar e ponto.
Tenho certeza de que lidar de forma equilibrada e serena e saudável com as emoções é o próximo passo evolutivo do homem principalmente porque é disso que mais fugimos. Mas como exercitar sem tentar? Até porque nem sempre é possível fugir. Eu não queria ter ido lá naquele dia. Meu pai não estava naquele saquinho de cinzas, embora estivesse de algum modo, entende? Mas eu fui. Tinha de ir. Como faltar?
Nessas horas, intimamente, se estremece como terremoto, algo salta pra fora, como lava, se revira coisa que tava quieta, é como turbulência, cair de bike, tomar uma vaca, ser atropelada numa travessia de água aberta. Mas passa. E vc está ali ainda: tudo no lugar, o mundo não parou não. Passa e vc continua sem certeza de que fará melhor na próxima, não sabe se o tranco vai ser mais ameno, igual ou pior. Não tem como saber.
Não se dá saltos evolutivos com facilidade, não é mesmo?!
Até porque, se a ideia é evoluir, o grau de dificuldade vai aumentando na medida que a gente vai ficando mais preparado. Ou alguém quer parar no meio do caminho?

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