14 janeiro 2006

Taxistas (cont.)

Não, não pretendia uma continuação, mas não é que pintou outra história?

5 – o vendedor
– A Mariana está incomodando aí? – pergunta o taxista, interrompendo o silêncio da corrida após o tradicional “aonde-vamos-por-onde-vamos”.
A passageira se faz um pouco de louca, vai que ele não está mesmo falando da boneca de pano acomodada com ela no banco de trás, no assento ao lado. Podia muito bem chegar até o destino sem mencionar a inusitada companhia, percebida de imediato ao entrar no carro.
– Ãh? – disfarça.
Mas ele estava sim falando da boneca de pano. Bem feitinha a Mariana, obra da mulher do taxista. E ele a coloca ali, a andar pela cidade até que alguém a compre (putz, esqueci o preço...). Priscila, loira, e Maria, morena, já tinham ganhado paradeiro, no quarto da filha de uma passageira e da neta de outra. Mariana é ruiva.
– É toda feita de fuxico – ele explica.
Que boa idéia, a passageira reconhece, já com a Mariana no colo.
– A gente sugere o nome, né... O cliente acata se quiser. É a minha mulher quem põe os nomes.
E a lábia do cara é melhor ainda. Cheia de psicologia: não se trata da compra de “uma” boneca, mas da Mariana.
– E tem o Desconectado – recomeça ele lançando um dos braços por trás do banco dianteiro para exibir o mais próximo possível do rosto da passageira o ímã de geladeira feito de lã, com quatro perninhas e um par de olhos cujas “íris” se desalinham. Também obra da criativa esposa, ele se orgulha, aproveitando o tempo do sinal fechado para iluminar o bichinho com a luz da tela do celular.
– É o que mais vendo. Dois reais.
O bichinho está lá agora, preso à porta da minha geladeira.
– Te dou uma idéia de pôr perfume nele, fica legal – sugere o taxista na despedida. – E se quiser mudar o nome dele...
– Não, não quero. Desconectado é ótimo.

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Bem juntinhas

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eu e a Búio